Ora viva. Estamos de volta. Directo à Questão.
Nas nossas duas próximas reflexões tentaremos perceber o que é que valorizam os alunos no momento da escolha de carreira. Afinal de contas, falamos do momento de decisão por um curso, por uma ocupação, por um destino de vida.
Com o aproximar do final do ano lectivo, milhares de alunos um pouco por todo o país vêem avizinhar, com maior ou menor ansiedade, o momento das grandes decisões de carreira. Em 2007, foram abertas mais de 46 mil vagas no ensino superior público. Cerca de 85% dos 40 mil candidatos foram colocados na primeira fase do concurso de acesso. Mas, afinal, o que é que norteia a decisão dos alunos no momento da escolha por este ou aquele curso, por esta ou aquela universidade ou instituto? Porque é que ouvimos sistematicamente expressões como “escolhi este curso porque me apeteceu” ou “vou para aquela universidade porque os meus amigos vão todos para lá” ou ainda “fui para aquele curso porque não consegui entrar naquele de que realmente gostava”?
Entrar para a universidade continua a ser sinónimo de aquisição de um certo estatuto social, apesar de ser cada vez menos uma garantia de sucesso profissional. Pese embora esta desvalorização dos títulos académicos no mercado de trabalho, a obtenção de um diploma continua a constituir um objectivo primordial para um crescente número de alunos. Assim, o diploma tem cada vez mais um valor cultural e menos um valor profissional. Chega a ser impressionante como muitos alunos pretendem ingressar no Ensino Superior apenas pelo estatuto auferido, na maior parte das vezes resultado, inclusive, de enormes pressões sociais (sobretudo, familiares) para o prosseguimento de estudos. Esta situação toma contornos particularmente relevantes se pensarmos como existe, em Portugal, uma enorme carência de profissionais qualificados de nível intermédio e que, para estes cursos, concorrem sobretudo alunos que não encontram vias de formação alternativas.
Mais grave ainda é a ausência completa, em muitos dos casos, de quaisquer motivos válidos para a escolha deste ou daquele curso, sobretudo quando se tratam de cursos completamente dissonantes com interesses, valores e expectativas dos alunos. O sistema montado para o processo de ingresso no Ensino Superior começa por partir, quanto a nós erradamente, do pressuposto de que os alunos possuem um auto-conhecimento e um nível de desenvolvimento de carreira que lhes permita uma escolha consciente, ou seja, parte do pressuposto errado de que os alunos possuem uma maturidade de carreira capaz de uma decisão racional e ponderada.
Contudo, o que podemos facilmente constatar é que a maior parte das decisões de carreira continuam a ser pautadas pelo acaso, pela arbitrariedade e pelo imediatismo. Muitas das vezes, os alunos escolhem uma profissão, não porque se imaginem e projectem no futuro a desempenhá-la, mas porque o vizinho do lado também assim fez, ou porque a formação na área não tem aquela disciplina considerada difícil. Por muito que se tente desconstruir todo um conjunto de ideias baseadas em informação parcelar e enviesada, muitas das decisões dos nossos alunos continuarão a fundar-se na comparação social com os colegas e na influência dos seus modelos de referência.
Mais de dois terços dos alunos matriculados no 12.º ano frequentam a Área de Ciências e Tecnologias. Destes, existe uma quantidade exorbitante de alunos que pretende seguir um curso superior na área das ciências da saúde. Cursos como os de Medicina, Ciências Farmacêuticas, Psicologia, Bioquímica ou Tecnologias da Saúde (por exemplo, Fisioterapia, Radiologia, Análises Clínicas, entre outros) figuram, ano após ano, nos primeiros lugares do top de preferências dos alunos, possuindo, por isso, elevadas médias de acesso. Parece-me que a existência de um tão elevado número de alunos “interessados” (e sublinhe-se o termo “interesse”) em enveredar por este tipo de cursos constitui uma probabilidade irrealista. É impossível que os interesses de todos os alunos que procuram estes cursos superiores convirjam no mesmo sentido; é impossível que haja, por “vocação” (mais um termo que sublinho, “vocação”), tantos médicos ou psicólogos, por exemplo.
Na próxima semana, proponho que analisemos os dois termos que acabei de sublinhar. Interesse e vocação. O que é que os distingue? Devemos ou não valorizar os interesses de quem decide? Devemos ou não continuar a falar em vocação?
Até lá. Directo à Questão.
Ora viva. Estamos de volta. Directo à Questão.
A recente mudança de Jorge Coelho, antigo Ministro da Administração Interna e das Obras Públicas do Governo de António Guterres, para a construtora Mota-Engil, depois de ter exercido funções na empresa enquanto consultor contratado, relançou o debate sobre a saída de figuras públicas da senda política para assumirem lugares de gestão em organizações privadas que integram sectores que tutelaram enquanto governantes.
A situação não é nova. Longe disso. São inúmeros os exemplos de políticos que saem do público para empresas privadas com um core business ligado às áreas em que foram governantes. Luís Parreirão, do Partido Socialista, foi Secretário de Estado das Obras Públicas do segundo mandato do Governo de António Guterres e é actualmente o presidente da Aenor e da empresa da Mota-Engil para as concessões e transportes. Pina Moura, também do PS, foi Ministro das Finanças e da Economia de António Guterres e actualmente lidera a espanhola Iberdrola. No lado oposto do espectro político, Ferreira do Amaral, influente nome do Partido Social Democrata, foi Ministro das Obras Públicas do Governo liderado Cavaco Silva e é o actual presidente da Lusoponte.
A oposição reagiu em bloco à fuga de Jorge Coelho para a Mota-Engil, afirmando que se trata de um acto denunciador da promiscuidade existente entre a gestão pública e a gestão privada. Será mesmo isso? Ou melhor, será mesmo só isso? Afinal, qual é a vantagem que as empresas privadas vêem na inclusão nos seus quadros de gestão de figuras que anteriormente passaram pelo Governo, sobretudo por ministérios ligados ao mesmo sector de mercado da empresa?
O problema começa precisamente no sobrepeso do sector público na economia nacional. Estamos perante um Estado gordo e corpulento, excessivamente burocrático, desequilibrado e pouco produtivo. É certo que é necessário retirar o excesso de gordura que tolda a flexibilidade e reduz a produtividade do Estado; porém, é também necessário muscular o aparelho estatal no sentido de o tornar forte como fiscalizador e regulador. E esse desafio governativo está longe de ser cumprido.
Neste contexto de rigidez processual e elevado peso do Estado sobre as empresas, é fácil perceber a importância do conhecimento dos dossiers públicos e da experiência em funções governativas. Sobretudo quando o sector privado depende tanto do investimento público, como acontece na realidade nacional. E no caso particular das empresas de construção civil, como acontece com a Mota-Engil, fica ainda mais patente essa dependência directa do investimento público.
Por outro lado, na decisão de saída para o privado sobreleva ainda o baixo reforço que constitui o trabalho no sector público. Basta tomar como exemplo o caso recentemente noticiado da fuga de médicos do público para o privado. Podemos então afirmar que a carreira no sector público é pouco aliciante? Mal paga? Demasiado criticada? Pouco compensada? Certamente que sim. No entanto, esta não é uma conclusão linear. Por muito mal pagos que sejam os políticos com influência na tomada de decisão governativa, não esqueçamos que o desempenho de cargos públicos tem um elevado peso no currículo de quem os exerce. É indesmentível que o desempenho de cargos na Administração Pública funciona não raras vezes enquanto rampa de lançamento para o trabalho no privado.
Independentemente das motivações que possam ter levado Jorge Coelho a aceitar o convite da Mota-Engil e das questões éticas que devem nortear sempre uma decisão deste género, não devemos deixar de considerar esta etapa como um justo prémio de carreira para o incansável político do aparelho socialista. Não fosse essa imagem que criou junto dos círculos do PS, dificilmente teria surgido este convite.
Afinal de contas, as sociedades e os actores sociais têm o serviço público correspondente às suas expectativas. Nas palavras de Mintzberg, proeminente nome da gestão, se as pessoas alimentam crenças de que o Estado é pesado e burocrático, então é assim que ele será. Pelo contrário, se reconhecerem o serviço público enquanto a causa nobre que efectivamente representa, então encontrarão um Estado forte e justo. E uma nação necessita sobretudo de que ambos os sectores, público e privado, sejam fortes, interagindo num saudável equilíbrio.
Até para a semana. Directo à Questão.
Ora viva. Estamos de volta. Directo à Questão.
O recente entendimento conseguido entre o Ministério da Educação e os Sindicatos que representam a classe docente sobre a tão contestada questão da avaliação de desempenho dos professores constitui um marco histórico nas sempre conturbadas relações entre Governo e Associações Sindicais. No entanto, mais importante do que tentar perceber como andam as relações entre Sindicatos e Ministério, importa assinalar a relevância dos ajustes efectuados ao processo de avaliação de professores. Todas as partes parecem estar de acordo num ponto essencial: é importante proceder a uma avaliação justa e rigorosa do trabalho dos docentes. Os pontos de divergência são outros e conduziram a uma histórica marcha de protesto pelas ruas de Lisboa.
Um dos principais factores de discordância é a questão dos critérios de avaliação. Muito se tem discutido sobre a participação dos encarregados de educação no processo ou sobre a importância dos resultados escolares dos alunos na avaliação do desempenho de quem os ensina. O que é indiscutível é que um sistema de avaliação eficiente e rigoroso não existe sem critérios objectivos e deve resultar de métodos participados que envolvam o maior número de intervenientes possível.
Mais delicada é a questão dos prazos em que o processo deve decorrer. E é aqui que nos parece estar o mais decisivo ganho deste entendimento entre Sindicatos e Ministério. É simplesmente inconcebível introduzir um tão complexo sistema a meio de um ano lectivo. Por isso, era imperiosa a flexibilização de prazos sem prejuízo da continuidade do processo, já em andamento na maior parte das escolas do país. E tal foi conseguido, uma vez que os professores que dependem de uma avaliação este ano lectivo, designadamente os professores contratados, vão ver mesmo o seu desempenho avaliado, num processo mais simplificado.
Ora então temos que… O Ministério sai a ganhar porque mantém o processo de pé, ajustando apenas os timings de aplicação das regras. Os Sindicatos saem a ganhar porque, quer o Governo queira admitir ou não, o que é certo é que estamos perante um recuo. Assim sendo, não podíamos estar todos mais contentes. Ou será que podíamos?
Os professores continuam a ser uma das classes profissionais mais desmotivadas, que tantas vezes luta contra a maré como se acomoda na mediocridade, com efeitos devastadores em todo o sistema educativo. No nosso modo de ver, esta desmotivação resulta de uma heterogeneidade qualitativa e não de factores remuneratórios.
Se não vejamos: Os salários dos professores portugueses ponderados ao custo de vida estão no topo da tabela dos países da OCDE. O sistema de progressões foi ao longo dos anos, na prática, absolutamente automático, com consequências financeiras notórias. Dos cerca de 6 mil milhões de euros orçamentados anualmente para o sector da educação em Portugal, perto de 82% correspondem a despesas com o pessoal e apenas 2% a investimentos.
Contudo, como escrevia recentemente um professor numa das colunas de opinião do jornal Público, “os professores encontram-se desmotivados e tristes, pois são «pau para toda a colher», exigindo-lhes tudo, mas mesmo tudo”. O “professor caracol”, como já lhe chamaram, que anda de terra em terra, sem conseguir um lugar de efectividade numa escola, ao qual se encontra reservado um futuro incerto, pode ser uma das justificações para o que se passa actualmente com o corpo docente em Portugal.
Se a isso juntarmos o completo alheamento de muitos pais e encarregados de educação relativamente ao percurso escolar dos filhos, delegando nos professores toda a responsabilidade pela educação dos alunos e culpabilizando-os pelas situações de insucesso ou inadaptação, então facilmente percebemos porque é que a classe docente, com o seu tão importante papel civilizador, se encontra mergulhada num limbo, o qual prejudica gravemente o normal funcionamento de todo um sistema de ensino, já de si débil e frágil.
Não esqueçamos, pois, as palavras de Fernando Savater, São os professores que estão incumbidos de “lutar contra a fatalidade, contra o destino. A fatalidade de que o filho de um pobre seja sempre pobre, de que o filho de uma pessoa ignorante seja sempre ignorante e de que o filho de um fanático seja sempre um fanático. Para evitar essas fatalidades é que precisamos da educação”.
Até para a semana. Directo à Questão.
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