Quarta-feira, 25 de Março de 2009
Ora viva. Estamos de volta. Directo à Questão.
Elvira Fortunato é portuguesa. É investigadora da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa. Dirige o Centro de Investigação de Materiais (Cenimat). E venceu, no ano passado, o primeiro prémio do European Research Council na área das Engenharias e Ciências Físicas, no valor de 2 milhões e 250 mil euros.
No entanto, a grande maioria dos portugueses não conhece esta distinta personalidade lusa.
Elvira Fortunato é uma das cinco melhores investigadoras em electrónica transparente a nível mundial e já ultrapassou Cristiano Ronaldo na lista de portugueses mais citados na Internet. A sua vitória no European Research Council transportou-a rapidamente para as primeiras páginas de vários jornais e revistas especializadas.
Então quem é esta brilhante investigadora da Universidade Nova de Lisboa?
O trabalho na área dos transístores garantiu a Elvira Fortunato um papel de destaque no cenário das Tecnologias da Informação e da Comunicação. Elvira Fortunato integra uma equipa que conseguiu tornar o papel parte integrante de um transístor usando-o como isolante, em vez do tradicional silício, um projecto designado por "Invisible". Estes desenvolvimentos podem ser usados no campo da electrónica descartável, em ecrãs, etiquetas e pacotes inteligentes ou aplicações médicas na área dos bio-sensores. A mesma equipa desenvolveu com a Samsung uma nova geração de ecrãs planos transparentes baseada na descoberta de um novo material semicondutor para os transístores constituído por óxidos, como o óxido de zinco.
Elvira Fortunato tem em mãos, basicamente, uma das mais cobiçadas patentes a nível mundial, a patente dos transístores em papel, que pode revolucionar tanto a electrónica como o paradigma das publicações em papel, possibilitando, por exemplo, a concepção de jornais e revistas com imagens em movimento. Contudo, como noticiou recentemente o Jornal Público, a indústria portuguesa ou radicada em Portugal nunca se mostrou verdadeiramente interessada nos seus projectos.
A homenagem que a Assembleia da República prestou a Elvira Fortunato, no passado dia 13 de Março, com um voto de congratulação aprovado por unanimidade, trouxe para a opinião pública esta lamentável situação que envolve a ciência e a tecnologia concebidas em Portugal. No dia da homenagem, a investigadora não escondeu a sua decepção face ao país de onde tem resistido sair. Disse, na altura: “Portugal é muito grande, os portugueses é que são pequeninos”.
Elvira Fortunato, na entrevista ao Público, não escondeu o seu desejo de que a descoberta de que é protagonista – e que pode revolucionar todo o cenário na área das Tecnologias da Informação e da Comunicação - fosse rentabilizada por um consórcio de indústria portuguesa. Mas quando procurou papeleiras portuguesas para parceiras na investigação, viraram-lhe as costas. A parceria foi para a brasileira Suzano. Recebeu grandes ofertas de multinacionais mas acabou por ser a Universidade Nova de Lisboa que pegou no projecto, mantendo para já a inteligência em Portugal.
Mas até quando será possível reter este “know-how” no nosso país? A persistência e a resistência da investigadora em sair de Portugal devem ser realçados. Mas o cenário vivido por Elvira Fortunato e pela sua equipa de investigação não é mais do que um Retrato da forma como Portugal gere os seus melhores cérebros. Basta pensar no exemplo de António Damásio, um dos investigadores mais estudados em todo o mundo, que nunca encontrou em Portugal as condições para o desenvolvimento da sua actividade.
Até para a semana. Directo à Questão.
Quarta-feira, 18 de Março de 2009
Ora viva. Estamos de volta. Directo à Questão.
Depois de, numa das nossas últimas reflexões, termos eleito os melhores filmes do ano e, de alguma forma, antecipado a cerimónia dos Óscares, ficou a promessa de regressarmos aos microfones desta Rádio para o balanço da festa e a análise das nossas principais previsões.
Da cerimónia do passado dia 22 de Fevereiro, ressalta que, ao contrário das expectativas de muitos, "Quem quer ser Bilionário?" conquistou - mais do que justamente na minha opinião pessoal! - o Óscar de Melhor Filme. A obra de Danny Boyle terminou a noite da 81.ª edição dos prémios da Academia como a película mais premiada, com oito estatuetas douradas, entre as quais a de Melhor Realizador e Melhor Argumento Adaptado.
A história de um rapaz dos bairros de lata de Mumbai conquistou a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, vencendo todas as estatuetas para que estava nomeada, com excepção do prémio para Mistura de Som, em que perdeu para Batman e "O Cavaleiro das Trevas".
Numa cerimónia completamente invulgar e original, mas muito bem conduzida, Slumdog Millionaire, contra os milhões de Hollywood, ganhou Oscar atrás de Oscar, provando a vitalidade do cinema independente.
Não se trata, efectivamente, de uma obra consensual. Na minha opinião, o Danny Boyle já fez, de facto, tão bom ou melhor ("Trainspotting", "28 Dias Depois" ou "Sunshine" não ficam nada atrás de "Quem Quer Ser Bilionário?"). Mas confesso que me espantam algumas críticas destrutivas ao filme. Sem ser um primor interpretativo (não espanta, por isso, que nenhum dos actores tenha recebido qualquer nomeação para Oscar), o filme é possuidor de um excelente argumento, é esplendoroso em termos musicais, tem uma óptima fotografia e (e, preciosismos e características técnicas à parte, é isto que interessa no final) é uma obra que cativa o espectador do primeiro ao último minuto. Uma mágica e oportuna lição de vida e de amor... Afinal não é essa a grandeza do cinema?
"Quem Quer Ser Bilionário?" é, sem dúvida, o filme do ano. E não é qualquer filme que conquista oito Óscares. Por isso já tem o seu lugar marcado na história da sétima arte.
Quanto aos restantes prémios, "O Estranho Caso de Benjamin Button" levou para casa três prémios (Melhor Cenografia, Maquilhagem e Efeitos Visuais), não deixando, contudo, de ser o grande derrotado da noite.
Sem grandes surpresas, Sean Penn, Kate Winslet, Penélope Cruz e Heath Ledger (este último condecorado a título póstumo) levaram os prémios de interpretação. Sean Penn é arrebatador em “Milk”, Kate Winslet prova em “O Leitor” aquilo que toda a gente já sabia (que é uma das mais brilhantes actrizes da actualidade), Penélope Cruz recebe o prémio que há já muito merecia por direito próprio, e a vitória de Heath Ledger vem confirmar que o cinema perdeu uma estrela no auge do seu brilho.
Uma nota final para Mickey Rourke que, apesar da sua assombrosa interpretação em “The Wrestler”, não conseguiu convencer os membros da Academia. Fica, contudo, para a história, a verdadeira ressurreição do actor num filme que vive e bebe cada cena no seu fantástico desempenho individual.
Até para a semana. Directo à Questão.
Sexta-feira, 13 de Março de 2009
Ora viva. Estamos de volta. Directo à Questão.
Assinalaram-se no passado dia 25 de Fevereiro, 154 anos sobre o nascimento de um dos maiores poetas da história da literatura portuguesa: Cesário Verde.
Escrevia Clara Ferreira Alves, em 2001 no Jornal Expresso,"Vida breve teve Cesário Verde. Nasceu em Lisboa em 25 de Fevereiro de 1855, morreu em Lisboa a 19 de Julho de 1886. Tinha 31 anos, idade absurda para morrer com uma tuberculose. Cesário Verde pode ter morrido cedo, pode ter sido esquecido, pode ter sido uma das vítimas da sombra pessoana projectada sobre quase toda a poesia portuguesa posterior. Continua a ser um dos maiores poetas da língua portuguesa e, passe a hipérbole, da literatura europeia, mundial, o que quiserem.
Cesário é mais um poeta do século XX do que do século onde nasceu, e a sua linguagem, estilo, métrica, vocabulário, a concisão dos seus «alexandrinos originais e exactos», como ele diz, sagram-no como um dos inventores do português que usamos. Maria Filomena Mónica, na notável biografia que escreveu de Eça de Queiroz, chega a uma conclusão semelhante. Se Eça libertou a prosa portuguesa da «retórica fradesca» que a dominava, Cesário libertou a língua das amarras do lirismo piegas e do sentimento exaltado, das teias de aranha do ideal parnasiano e do romantismo rendilhado. Maria Filomena Mónica diz que nenhum autor inovou como Eça, «com a possível excepção de Cesário Verde»."
Não é um pintor, é Cesário Verde quem antecipa o impressionismo em Portugal, no final do Século XIX. O seu poema De Tarde, como que pintando palavras com uma inigualável mestria, apresenta-se ao leitor como uma verdadeira tela de Renoir:
Naquele “pic-nic” de burguesas,
Houve uma coisa simplesmente bela,
E que, sem ter história nem grandezas,
Em todo o caso dava uma aguarela.
Foi quando tu, descendo do burrico,
Foste colher, sem imposturas tolas,
A um granzoal azul de grão de bico
Um ramalhete rubro de papoulas.
Pouco depois, em cima duns penhascos,
Nós acampámos, indo o sol se via;
E houve talhadas de melão, damascos
E pão de ló molhado em malvasia.
Mas, todo púrpuro, a sair da renda
Dos teus dois seios como duas rolas,
Era o supremo encanto da merenda
O ramalhete rubro das papoulas!
Até para a semana. Directo à Questão.
Quinta-feira, 5 de Março de 2009
Ora viva. Estamos de volta. Directo à Questão.
O progresso da humanidade cria, diariamente, novos contextos, obrigando-nos à permanente (re)leitura do mundo. Neste contexto, há que reconhecer a questão – uma das maus basilares do ser humano – da importância que tem em toda parte a capacidade de ler e escrever. Para os indivíduos, para as comunidades, para as sociedades, a alfabetização constitui uma necessidade básica de hoje e de sempre. Não serão demais todos os esforços empreendidos nesta área em favor do desenvolvimento humano sustentável.
Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística relativos a 2001, data dos últimos Censos, Portugal tem ainda uma taxa de analfabetismo na ordem dos 9%, ou seja, nove em cada cem pessoas continuam a não saber ler nem escrever. Na Região Centro, este número sobe para 11% e, no caso concreto do Concelho da Sertã, em 2001, tínhamos uma taxa de analfabetismo de mais de 19%. Ainda assim, em 2001 a taxa de analfabetismo foi inferior à de 1991, verificando-se uma significativa tendência de decréscimo. Estes elevados níveis de analfabetismo são grandemente explicados pelo peso relativo da população idosa nesta região.
Estima-se que 862 milhões de adultos em todo o mundo, dois terços dos quais mulheres, são excluídos de uma plena participação na sociedade, dada a sua condição de analfabetos. Em 2003 foi lançado um desafio pela UNESCO, que apelou à congregação de esforços, no sentido de alcançar a meta de uma melhoria de 50 por cento nos níveis da alfabetização adulta, especialmente no caso das mulheres, até 2015. Integrado no programa “Educação para Todos”, o desafio proposto é a garantia de uma educação básica de qualidade para todas as crianças, de modo a criar uma base duradoura para a competência na linguagem escrita.
No mundo, cerca de um adulto em cada cinco é analfabeto, o que é insustentável. Como poderão existir sociedades equitativas ou democracias auspiciosas se tantas pessoas estão privadas dos instrumentos básicos da alfabetização? Como podem prosperar o diálogo entre as culturas e a sua compreensão recíproca se é tão grande o fosso que as divide em termos da competência na leitura e na escrita? Como é possível erradicar a pobreza se as raízes da ignorância são deixadas intactas?
O direito à instrução é um direito humano fundamental. Ocupa um lugar central nos direitos humanos e é essencial e indispensável para o exercício de todos os direitos humanos restantes e para o desenvolvimento. Como um direito do empowerment, a instrução é o veículo preliminar através do qual os adultos e as crianças económica e socialmente marginalizados podem sair da pobreza, e obter os meios para participar inteiramente nas suas comunidades. Nenhuns dos direitos civis, políticos, económicos e sociais dificilmente podem ser exercidos por quem não tenha recebido alguma instrução mínima.
Contudo, apesar de todos os esforços envidados no sentido de garantir que todo o cidadão receba, pelo menos a instrução básica, o facto é que muitas crianças permanecem ainda privadas das oportunidades educacionais, muitas delas oriundas de famílias de baixos recursos. A ignorância é em si mesma uma forma de insegurança. A incapacidade de ler ou escrever, de contar ou comunicar representa uma enorme privação que não pode ser descurada no âmbito das políticas de desenvolvimento social.
Até para a semana. Directo à Questão.