Quinta-feira, 27 de Agosto de 2009

A Ética na Prática Profissional do Psicólogo (II)

Ora viva. Estamos de volta. Directo à Questão.

 
 
Continuamos hoje a nossa reflexão sobre alguns dos princípios éticos pelos quais se deve reger o psicólogo no desempenho da sua prática profissional. Exploramos aqui algumas das questões que marcam a prática profissional de quem aconselha na área da psicologia, mas também de quem recebe esses serviços, todos aqueles que diariamente consultam um técnico de psicologia.
Uma das questões éticas mais relevantes nesta área prende-se com o direito ao acesso à informação por parte do cliente. O processo de providenciar ao cliente a informação de que necessita para se tornar um participante activo na relação terapêutica começa com a sessão inicial e continua ao longo do aconselhamento. Contudo, a questão que se coloca é a de dar informação em demasia ao cliente ou, pelo contrário, não dar a informação na sua totalidade. Há sempre informação que não deve chegar ao cliente e, na minha opinião, o sujeito nunca deve saber tudo: deve manter-se durante todo o processo de aconselhamento num estado de procura, que o leve a tentar saber sempre mais e a conhecer-se melhor a si próprio. Esse esforço de busca conduz a um maior auto-conhecimento e à afirmação da identidade do cliente.
Concretamente num contexto que conheço bem, que é o contexto escolar, questiona-se ainda até que ponto pode o psicólogo permitir a crianças e adolescentes que mantenham uma relação terapêutica sem o consentimento dos pais ou de outras entidades superiores. A esse nível, parece-me ser inteiramente justificável, ainda que apenas em casos pontuais, precisamente porque, de outra forma, talvez os alunos nem sequer procurassem ajuda. Em casos como os de abuso físico ou psicológico, aborto, gravidez indesejada, alcoolismo, toxicodependência ou conflitos familiares, percebe-se que o sujeito alvo não queira dar a cara e procure que os seus problemas não estravassem a relação terapêutica.
Na sua actividade profissional, o psicólogo deve ainda ser honesto, justo e manter o respeito pelos outros. Como afirmação da sua integridade, o psicólogo deve revelar uma total autenticidade na relação com o outro, renunciando, no entanto, à expectativa irrealista de que é possível um conhecimento total do sujeito.
É impossível que o psicólogo possa separar completamente as suas necessidades pessoais da relação com o cliente. O conselheiro precisa de tomar consciência das suas próprias necessidades, conflitos, defesas e vulnerabilidades para melhor perceber as necessidades do cliente.
Uma das questões mais pertinentes a este nível é a possibilidade de manutenção de uma relação pessoal com um cliente fora das sessões terapêuticas. Quais são os limites da relação terapêutica? Não há uma resposta consensual para esta questão. É sabido que é necessário que o profissional de psicologia mantenha as relações com os seus clientes numa base profissional. No entanto, alguns psicólogos defendem que amizades fora da terapia são um factor positivo na aquisição de confiança que conduz a resultados terapêuticos mais produtivos. Quando os técnicos se envolvem em relações duais, tendem a ser menos imparciais com o cliente, o perigo de exploração do cliente aumenta e este é colocado numa posição vulnerável face ao psicólogo.
Não há uma resposta concreta para nenhuma das questões aqui levantadas nas nossas duas últimas reflexões. Cabe ao psicólogo, enquanto profissional, que saiba dar resposta a cada situação com que se depare de forma consciente e adequada, que vá de encontro à especificidade do momento em questão. O que realmente importa sublinhar é que o técnico de psicologia nunca pode relegar para segundo plano as questões éticas e deontológicas, uma vez que elas condicionam toda a prática de aconselhamento.
 
Até para a semana. Directo à Questão.
publicado por Ricardo às 11:27
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Quinta-feira, 20 de Agosto de 2009

A Ética na Prática Profissional do Psicólogo (I)

 

Ora viva. Estamos de volta. Directo à Questão.
 
Quando se fala em princípios éticos pelos quais se deve reger o psicólogo no desempenho da sua prática profissional, fala-se num conjunto de questões com as quais o profissional de psicologia é confrontado no seu dia a dia e para as quais não há uma resposta universal. No entanto, é importante que o psicólogo esteja atento a elas e tenha maturidade profissional para saber lidar com situações mais ou menos problemáticas. Nas nossas duas próximas reflexões, exploramos algumas dessas questões que marcam a prática profissional de quem aconselha na área da psicologia, mas também de quem recebe esses serviços, todos aqueles que diariamente consultam um psicólogo para pedir ajuda, para receber aconselhamento, para fazer tratamento psicoterapeutico, ou, simplesmente, para trocar dois dedos de conversa.
A ética pode ser definida como o estudo teórico dos princípios que governam as nossas escolhas práticas. É uma reflexão sobre o porquê de se considerarem determinadas condutas e normas como válidas. Em termos figurados, a natureza da ética corresponde ao máximo esforço de cada um no sentido de esclarecer perante si mesmo as ideias do Bem e do Mal.
Não podemos dissociar o conceito de ética do conceito, também ele bastante abrangente, de deontologia. Trata-se de um conceito muito próximo do de moral profissional e caracteriza-se por propor códigos de acção ou impor respostas e definir leis, normas, imperativos ou interditos. No fundo, trata-se da delimitação das margens de liberdade da profissão.
O psicólogo deve manter elevados padrões de competência no seu trabalho e reconhecer, não só as suas potencialidades, mas também os seus limites. É ainda importante que o psicólogo restrinja o exercício das suas funções à aplicação de técnicas e fornecimento de serviços apenas para os quais se encontra qualificado através da educação, treino formal e prática.
O psicólogo deve ainda saber reconhecer as suas responsabilidades profissionais para com a comunidade e a sociedade. Assim, é fundamental que pese convenientemente as consequências que as suas actividades profissionais possam ter no cliente, mas também na sociedade. Percebe-se, deste modo, que deva manter elevados padrões de conduta, clarificar os seus papéis e obrigações profissionais e assumir a responsabilidade apropriada pelo seu comportamento, nomeadamente pela escolha, aplicação e consequências das estratégias, métodos e técnicas utilizados.
O psicólogo deve ser o primeiro a preocupar-se pelo bem estar das pessoas e pela protecção dos seus interesses, com especial atenção para as minorias étnicas, raciais, linguísticas e sociais e para as pessoas portadoras de deficiências.
Na prática profissional do psicólogo, é ainda importante que este saiba respeitar e promover os direitos fundamentais das pessoas, a sua liberdade, dignidade, privacidade, autonomia e bem estar psicológico. Deste modo, deve tomar as medidas necessárias para evitar prejudicar aqueles com quem interage profissionalmente e para minimizar danos, quando estes são previsíveis e inevitáveis.
É a este nível que surgem as delicadas questões do sigilo profissional e respeito pelo anonimato e confidencialidade. Uma das questões mais problemáticas com a qual o psicólogo se pode confrontar reside precisamente na quebra ou não da confidencialidade em casos em que é a vida do próprio cliente que está em jogo. Para defender a integridade física e psicológica da pessoa que tem pela frente (por exemplo, em casos de suicídio), parece-me válida a quebra da confidencialidade por parte do profissional. Dizer à família do cliente ou outras pessoas significativas que pode estar prestes a ocorrer uma tragédia, pode fazer com que eles próprios ajudem o sujeito, com o seu apoio, a evitar o pior.
 
 
Até para a semana. Directo à Questão.
 
publicado por Ricardo às 11:23
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Quinta-feira, 13 de Agosto de 2009

Recordando Miguel Torga

 

Ora viva. Estamos de volta. Directo à Questão.
 
A 12 de Agosto de 1907, faz hoje 102 anos, nascia em São Martinho de Anta, concelho de Sabrosa, Trás os Montes, o escritor Miguel Torga, nome literário do médico Adolfo Correia da Rocha. Tal pseudónimo encontra-se intimamente ligado à aldeia onde nasceu e que o viu crescer. Torga é o nome dado à urze campestre que sobrevive nas fragas das montanhas, com raízes muito duras infiltradas por entre as rochas.
Depois de uma breve estadia no Porto, frequentou apenas por um ano, o seminário em Lamego. Em 1920 partiu para o Brasil, onde foi recebido na fazenda de um tio. Regressou depois a Portugal acompanhado do tio, que se prontificou a custear lhe os estudos em Coimbra. Em apenas três anos fez o curso do liceu, matriculando se a seguir na Faculdade de Medicina, onde terminou o curso em 1933. Exerceu a profissão na terra natal, passou por Miranda do Corvo, mas foi em Coimbra que alguns anos mais tarde acabou por se fixar. Iniciou a sua obra literária logo após ter entrado para a universidade, com os livros "Ansiedade" e "Rampa". Mas só em 1936 passou a usar o pseudónimo que o havia de imortalizar. Não oferecia livros a ninguém, não dava autógrafos ou dedicatórias, para que o leitor fosse livre ao julgar o texto.
Proposto várias vezes para o Prémio Nobel da Literatura, a sua vasta obra abrange a poesia, o romance, o teatro, o conto, as crónicas de viagem e as memórias. Ganhou vários prémios, entre eles o Grande Prémio Internacional de Poesia em 1977, o Prémio Montaigne em 1981 e o prémio Luís de Camões em 1989. Com ideias que se demarcavam do regime salazarista, então em vigor no nosso país, chegou a ser preso e pensou em sair de Portugal, mas não o fez por se sentir preso à pátria e à sua terra natal, Trás os Montes, que evocaria em muitos dos seus poemas. Expoente máximo da literatura portuguesa do século XX, haveria de falecer em 1995, com 88 anos.
De seguida, recordamos “Súplica”, um dos seus mais vibrantes poemas, uma demonstração pura da ânsia e do desespero que marcam a poesia de Torga. A expressão de um indivíduo vibrante e enternecido pelas criaturas, irremediavelmente ligado á natureza.

Agora que o silêncio é um mar sem ondas,
E que nele posso navegar sem rumo,
Não respondas
Às urgentes perguntas
Que te fiz.
Deixa-me ser feliz

Assim,
Já tão longe de ti como de mim.
Perde-se a vida a desejá-la tanto.
Só soubemos sofrer, enquanto
O nosso amor
Durou.

Mas o tempo passou,
Há calmaria...
Não perturbes a paz que me foi dada.
Ouvir de novo a tua voz seria
Matar a sede com água salgada.
 
 
Até para a semana. Directo à Questão.
publicado por Ricardo às 09:54
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Quarta-feira, 5 de Agosto de 2009

Os Açores, uma janela de oportunidade para o turismo em Portugal

 

Ora viva. Estamos de volta. Directo à Questão.
 
De visita ao Arquipélago dos Açores, constatei que afinal ainda existe um pedaço de Portugal que preserva o que de mais belo existe na natureza e nos costumes do nosso povo.
À beleza natural das suas nove ilhas, onde o exuberante verde da paisagem contrasta com o extasiante azul do mar que as rodeia, juntamos as vincadas tradições e costumes populares e a hospitalidade daquela gente. O resultado é um ambiente calmo e tranquilo, uma envolvência mágica e retemperante, uma paz e serenidade avassaladoras.
Perdidas no Atlântico, cada uma das ilhas açorianas marca pelas suas particularidades, constituindo, cada qual à sua maneira, um espaço de beleza singular que se demarca de todos os restantes. Das arrebatadoras lagoas de São Miguel ao verde único das Flores, passando pelo esplendor da montanha do Pico e pelo impressionante Vulcão dos Capelinhos, no Faial, a prova viva de que aquelas terras basálticas continuam bem activas e se constroem e reconstroem naturalmente a cada segundo que passa.
Pela sua particular singularidade, destaco aqui as Fajãs, características da ilha de São Jorge, superfícies planas que se prolongam pelo mar, provenientes de abatimentos da falésia. Muitas delas convertidas em férteis pomares e em ricos campos de cultivo, graças a um microclima muito próprio, marcam pela forma majestosa como se impõem na paisagem e pelo facto de constituírem a manifestação extrema da forma como os Açores mantém intacto o que de melhor existe na natureza. Na sua grande maioria inacessíveis de carro, privadas de rede telefónica e mesmo de electricidade, chegar às Fajãs proporciona ainda agradáveis percursos pedestres, que permitem desfrutar destes locais no seu máximo esplendor.
Por tudo isto e muito mais, os Açores são mesmo um local de visita obrigatória. Por acaso sabia que a grande maioria das paisagens que vê nos spots publicitários que divulgam o turismo em Portugal são paisagens açorianas?
Então porque é que o mundo não conhece estas paradisíacas ilhas? Pior, porque é que mesmo a grande maioria dos portugueses não conhece os Açores? Talvez porque continua a ser um destino pouco divulgado. Talvez porque tem apostado pouco na criação de condições para o acolhimento e exploração turísticas. Também como consequência destas, talvez porque continua a ser um destino caro.
Presos ao passado, durante muitos anos fechados ao mundo, os Açores continuam a não explorar devidamente aquele que é o seu maior potencial de desenvolvimento: o turismo. O turismo de aventura, aproveitando os fantásticos recursos naturais, por exemplo para o montanhismo, o surf ou as caminhadas. O turismo rural, aproveitando a hospitalidade das gentes e as deslumbrantes paisagens. O eno-turismo, aproveitando a qualidade da produção vínica, de que são expoente máximo os néctares produzidos nas vinhas do Pico, classificadas Património da Humanidade pela UNESCO. Isto apenas para citar alguns exemplos.
Os Açores constituem, pois, com toda a certeza, uma verdadeira janela de oportunidade para o turismo em Portugal. No entanto, todo o potencial turístico daquele arquipélago deve ser explorado sempre tendo em conta a preservação das nobres tradições daquele povo e do harmonioso convívio entre natureza e ser humano, precisamente os seus principais pontos fortes em termos de potencial turístico. Para bem da economia local e nacional, urge abrir os Açores ao mundo, sem perder o que neles existe de mais belo. E não é pouco,
A nossa Atlântida, tão perto e por vezes tão longe.
 
Até para a semana. Directo à Questão.
publicado por Ricardo às 15:38
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